‘Preservar a instituição’ ou obstrução da Justiça?

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Em abril de 2018, o então comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, ameaçou publicamente o STF na véspera do julgamento do Habeas Corpus que, fosse concedido, colocaria Lula contra Bolsonaro nas eleições daquele ano. Atribui-se ao então chefe de gabinete de Villas Bôas a sugestão da parte mais dura daquela ameaça, que, afinal, surtiu efeito; a parte que falava em “repúdio à impunidade”. O chefe de gabinete do general Villas Bôas era o general Tomás Paiva, atual comandante do Exército.

Hoje, publicamente, o general Tomás Paiva e o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro – nesta ordem hierárquica -, esmeram-se numa mise-en-scène de que “nosso espírito é de colaboração” com as investigações sobre o 8/1, como disse Múcio nesta segunda-feira, 26, após sair de uma reunião com Tomás Paiva e Randolfe Rodrigues, líder do governo no Congresso.

Quem dizia a mesma coisa era justamente um milico-chave do processo golpista do ano passado, cujo nome Paiva e Múcio ora tentam, isto sim, traficar para as raias do esquecimento. Ao longo de 2022, o general Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, antecessor de Múcio na Defesa – e que também foi comandante do Exército -, salpicou seus ataques diuturnos ao sistema brasileiro de votação eletrônica com declarações de que agia movido não por golpismo, imagina, mas por “espírito colaborativo com o TSE”.

Longe dos microfones, mas não exatamente nos bastidores – o bloco da Operação Anistia desfila à luz do dia em Brasília -, Tomás Paiva e José Múcio atuam para blindar o alto generalato que esteve metido até os quepes na guerra contra as urnas eletrônicas, na proteção dos acampamentos terroristas, em reuniões secretas do Estado-Maior do Putsch da Joalheria com o contrabandista de Rolex, na sova de toda essa massa lêveda que, após dois meses assando no WhatsApp e na frente de quartéis, deu do 8/1.

“Repúdio à impunidade”, contribuiu o general Tomás Paiva com o tuíte do general Villas Bôas, anos atrás, para tirar Lula das eleições. “Repúdio à impunidade”, pois sim.

Democracia United Fruit

Hoje, enquanto o STF condena lúmpengolpistas a granel, o comandante de 235 mil soldados e o civil de quatro estrelas definem bois de piranha; interferem com polegares de Cesar na agenda de oitivas da CPMI; usam os cargos que ocupam para tentar tirar seus antecessores das investigações sobre o 8/1; exigem “individualizar condutas”, a fim de escamotear a coesão do Partido Militar na articulação golpista; emplacam na mídia que é necessário “preservar a instituição Forças Armadas” – nunca reformá-la, discuti-la, enquadrá-la nos termos da Constituição, responsabilizar seus comandos por aquilo que cometem, em coesão, à margem da lei.

Se os atuais comandante da PM e Secretário de Segurança do Distrito Federal agissem como estão agindo Tomás Paiva e José Múcio, ou seja, em turnê de conciliábulos por Brasília, a título de “preservar a instituição Polícia Militar”, arriscavam pegar um justo xadrez por tentativa de atrapalhar as investigações sobre uma tentativa de golpe de Estado.

Em uma República sem tutela militar, em vez desta Democracia padrão United Fruit Company, aqueles hoje empenhados neste tipo de conluio – e a palavra é esta, conluio – já teriam sido advertidos, pelo menos advertidos, sobre os perigos de costear tão ostensivamente a obstrução da Justiça, crime cuja pena é de três a oito anos de prisão.

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