Sobre o 'Termo de Ajustamento de Conduta' do Exército contra o golpismo
No suposto "TAC", redigido de próprio punho, a palavra “Democracia” não aparece nem uma vez sequer. "República"? "Poder civil"? Nem pensar. Mas está lá uma ameaçada tão velada quanto manjada.
Já esquecemos?
Na noite de 8 de janeiro de 2023, poucas horas após o ataque à Praça dos Três Poderes, o general chefe do Comando Militar do Planalto moveu tropas para o meio da avenida do Exército a fim de impedir a prisão dos esbirros do golpismo que tinham refluído para acampamento golpista montado e acalentado no Setor Militar Urbano.
O episódio de insubordinação armada teve direito a canhões de blindados Guarani apontados para Ricardo Cappelli; para os policiais militares do DF que estavam sob as ordens do interventor federal nomeado pelo presidente da República então sob franco ataque, sofrendo tentativa de golpe de Estado.
Em depoimento a Julia Duailib para o documentário “A Democracia resiste”, o ex-ministro da Justiça Flavio Dino relatou que naquele dia, ao se dirigir para o Setor Militar Urbano, deparou com “duas ou três linhas de formação da Polícia do Exército de frente não para o acampamento, mas para a PM”.
“Blindados do Exército se agrupando ali”; “soldados aparatados como se fosse para um combate”, disse Dino.
O nome do general chefe do Comando Militar do Planalto que ameaçou abrir fogo contra forças policiais sob intervenção civil federal - a fim de dar guarida, dar fuga aos terroristas que o Exército chocou -, o nome dele é Gustavo Henrique Dutra de Menezes.
O general Dutra, não obstante, ficou onde estava, na chefia do Comando Militar do Planalto, até abril de 2023, quando foi para o concorrido cargo de 5º Subchefe do Estado-Maior do Exército. Há um ano, em novembro do ano passado, porém, Lula e Múcio voltaram a promover o general, agora para Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército.
Agora, o Estado-Maior do Exército publica dois documentos - a Política de Ética Profissional e de Liderança Militar do Exército Brasileiro 2024–2027 e uma diretriz homônima - apresentados para a imprensa como “documentos do Exército para a luta contra a contaminação política e as fake news de olho em 2026”.
Nada nos documentos, porém, corresponde à “luta” descrita no briefing, a não ser que se enxergue uma pegada democrática quando se lê, por exemplo, que “o integrante do Exército, uniformizado ou não, deve comportar-se de acordo com os valores do soldado brasileiro, plenamente integrado à sociedade e pronto a cumprir sua missão constitucional”.
Mas a palavra “Democracia” não aparece nem uma vez sequer em nenhum dos dois documentos que compõem o suposto Termo de Ajustamento de Conduta, por assim dizer, do Exército contra o golpismo. A palavra “instituição” só aparece assim mesmo, no singular, autorrefencial. “República”? Nops. “Presidente da República”? Só rindo. A expressão “poder civil”? Nem pensar.
O que aparece, como se vê - e mais de uma vez - é isto da “missão constitucional” do Exército Brasileiro.
Tal e qual isto apareceu, em suas variações, nos tuítes com o quais o general Villas Bôas ameaçou o STF na véspera do julgamento do habeas corpus de Lula, em 2018, e na carta “Às instituições e ao Povo Brasileiro”, com a qual os chefes militares manifestaram apoio aos acampamentos golpistas e distribuíram avisos - ameaças também - a quem no Judiciário se atravesse a desmobilizá-los.
Os tuítes ameaçavam o STF com a observação, para o caso de Lula ser solto, de que o Exército Brasileiro se mantinha “atento às suas missões institucionais”; a carta de apoio aos acampamentos golpistas falava em “papel constitucional” das Forças “sempre em defesa do nosso Povo”…