No quebra-cabeça do golpe, não esqueça que 'o Tomás foi no VB'
Atual comandante do Exército foi até o general Villas Bôas, para dar "uma mijada" nele, no dia seguinte à data para matarem Lula, Alckmin e Moraes. O que sabia - e escondeu - o general Tomás Paiva?
O general Eduardo Villas Bôas, necromante do golpismo de coturno no Brasil, praticamente não posta nas redes sociais. Tirando um negacionismo climático aqui, um anúncio ali de que é o mais novo colunista de site de fake news, pode-se dizer que Villas Bôas praticamente só posta para “intervenção militar”.
Em abril de 2018, numa das poucas vezes em que se comunicou com seus seguidores no ex-Twitter, Villas Bôas, na época comandante do Exército, ameaçou o Supremo Tribunal Federal na véspera do julgamento do Habeas Corpus que poderia ter colocado Lula nas eleições daquele ano - já naquele ano - na disputa da presidência da República com Jair Bolsonaro.
A ameaça surtiu efeito. O Supremo negou o Habeas Corpus. O resultado é conhecido. Inclusive centenas de milhares de mortes evitáveis na pandemia. A frase nevrálgica daquela ameaça em forma de tuíte, “repudio à impunidade”, foi uma sugestão do então chefe de gabinete de Villas Bôas no Forte Apache, general Tomás Paiva, atual comandante do Exército, nomeado por Lula.
O tempo voa no Concorde, digo, na concórdia da impunidade, e no dia 15 de novembro de 2022 o general Villas Bôas publicou no ex-Twitter uma nota de apoio aos acampamentos golpistas, repercutindo a nota dos comandantes das Forças Armadas, divulgada quatro dias antes, também de apoio aos pedidos de “intervenção militar” na frente dos quartéis.
Naquele dia, conforme revelou nesta terça-feira, 19, a Operação Contragolpe, o major Rafael Martins Oliveira encaminhou ao tenente-coronel Mauro Cid um documento intitulado “Copa 2022”, que seria, segundo a Polícia Federal, uma estimativa de gastos para subsidiar as ações clandestinas que seriam executadas durante os meses de novembro e dezembro de 2022.
Inclusive os assassinatos de Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes, por tiro ou veneno - crimes planejados na casa do general Braga Netto. Os alvos tinham data marcada para morrer: 15 de dezembro, três dias após a diplomação de Lula. Naquele dia, seis militares chegaram a ir a campo para matar ou sequestrar Moraes, mas algo deu errado, fugiu do script.
Esse algo pode ter sido um vulgar imprevisto operacional ou pode estar aí, nesse algo, a chave para o Brasil saber quem participou e quem não participou, mas sabia da trama de golpe e do plano para matar o presidente eleito, o vice e o presidente da Justiça Eleitoral: quem, agente público fardado, sabia e nada fez; e quem, sempre fardado, sabia e talvez tenha feito alguma coisa - seja movido por legalismo, seja por análise de risco -, mas acobertou, encobriu, escondeu a conspiração e os conspiradores.
E acoberta, encobre, esconde até hoje.
Sobre essa pequena grande nuance do golpe, seria fundamental trazer à baila agora, à luz das revelações da Operação Contragolpe, uma informação em especial da Operação Tempus Veritatis, desencadeada em fevereiro.
A Tempus Veritatis revelou que o general Villas Bôas recebeu o seu antigo chefe de gabinete em sua casa no dia 16 de dezembro de 2022. Agora, com a Contragolpe, sabemos que esse dia foi o dia seguinte à data marcada para os assassinatos de Lula, Alckmin e Moraes; ao dia em que meia dúzia de militares estavam na tocaia de Moraes em Brasília, prontos para o bote, até que um deles disse no rádio: “abortar”.
Na época, Tomás Paiva era comandante militar do Sudeste, membro do Alto Comando do Exército. Conforme levantado pela Tempus Veritatis, Braga Netto disse assim ao capitão Aílton Barros, por mensagem de texto, no dia 17 de dezembro de 2022:
“O Tomás foi no VB [Villas Bôas] ontem... E aí...acredite... ele deu uma mijada no VB e na Cida [mulher de Villas Bôas]! Terminou dizendo que os dois serão prejudicados com as intervenções ‘sem noção’ que estão fazendo... na saída, ele resolveu abrir o jogo e falou mal de todo o ACE [Alto Comando do Exército]. (…). Parece até que ele é PT desde pequenininho...! Mostrou que ele tem que estar contra tudo que está acontecendo (…) Nunca valeu nada!! A ambição derrota o caráter dos fracos. Aliás...revela (…) A Cida ficou louca. Se retirou da sala pra não botar o artista pra fora!”
Então o general Tomás Paiva estava, ou tinha que estar contra tudo o que estava acontecendo? Palmas para o general Tomás Paiva. Então o general Tomás Paiva sabia de tudo que estava acontecendo, e calou-se, e permanece calado até hoje, porque família - “família militar” - é família, enquanto a Polícia Federal tenta montar o quebra-cabeça do golpe?
Em qual categoria de agente público fardado se enquadra o atual comandante do Exército Brasileiro? O que não sabia do golpe e do plano para assassinar quem viria a nomeá-lo para o posto, para a glória? O que sabia e nada fez? Ou o que sabia, fez alguma coisa, mas nunca trouxe a conspiração e os conspiradores à luz do dia, com todas as consequências deste silêncio, inclusive o 8/1?
No quebra-cabeça do golpe, a peça “O Tomás foi no VB” é absolutamente fundamental. Não obstante, parece ter sido esquecida pelos investigadores e pela imprensa, outrora investigativa. Muito conveniente para o tipo de “pacificação nacional” que, apesar de tudo, parece que tende a prevalecer.
Esta história fede muito.
Deve estar bem amarrada em 64...
O Brasil tem que lavar e passar bem a farda...