A Folha e as brechas que a Folha dá
Reportagem "patrocinada" sobre “a iminente volta de Jesus Cristo” associa, por exemplo, a pandemia de Covid-19 à quarta trombeta do apocalipse.
A ombusman da Folha de S.Paulo, Alexandra Moraes, abordou em sua coluna deste domingo, 8, a existência de “um estranho camelódromo sob textos da Folha”, “brecha a golpistas e charlatães”.
Não, não se trata de ex-presidente que tentou dar um golpe de Estado emplacando artigo de aceita-o-fascismo-que-dói-menos em seção do jornal historicamente associada à defesa da Democracia e dos Direitos Humanos.
Trata-se dos “anúncios nativos” de plataformas de “indicação de conteúdo”, verdadeiro balaio de vigarices com aparência editorial embaralhado com o conteúdo do jornal ao fim de cada reportagem, entrevista ou artigo publicado no site da Folha.
Mas não só da Folha ou outro jornalão.
Nesta segunda-feira, 9, em portais progressistas, “anúncios nativos” da mesma plataforma de “indicação de conteúdo” usada pela Folha diziam que “médicos do mundo estão chocados” com uma descoberta do “Dr. Glicose”.
Ou que uma “receita oriental seca a barriga em poucos dias”; ou “jogue no verdadeiro tigrinho e divirta-se”.
Em sua coluna, Alexandra Moraes reproduz carta de um leitor que afirma: “certamente [a Folha] não vai publicar no impresso algo com o selo ‘Publieditorial’ ou ‘Patrocinado’ sabendo que é um golpe”.
A coluna da ombudsman saiu na Folha impressa deste domingo na página A8. Na mesma edição da Folha, no mesmo caderno, um pouco mais adiante, a Folha imprimiu um “Publieditorial” ou “Patrocinado” de duas páginas, A22 e A23, de uma igreja evangélica.
Sob formatação suavemente distinta do conteúdo editorial, quase irmã gêmea, a “reportagem” sobre “a iminente volta de Jesus Cristo”, sobre “a proximidade do arrebatamento”, associa, por exemplo, a pandemia de Covid-19 à quarta trombeta do apocalipse.
Tem até entrevista com o procurador-geral de Justiça do Ministério Público do Espírito Santo, que tem “conexão com a igreja” e disse à “reportagem” que as “lições dos pastores” ajudam a “compreender o momento pelo qual passa a humanidade”.
No final das duas páginas, o informe: “conteúdo patrocinado produzido pelo Estúdio Folha”.