O velhos genocidas e a perigosa nova forma de acusação de antissemitismo

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O historiador Israelense Illan Pappé é autor de pelo menos dois livros centrais para a compreensão do assim chamado “conflito” Israel-palestinos: “Dez mitos sobre Israel” e “A limpeza étnica da Palestina”. Em artigo publicado neste domingo, 5, no site da Al Jazeera, Pappé discorre, no calor do chumbo mortífero de Israel contra Gaza, sobre o perigo do mais novo ardil do sionismo.

Abordando a reação virulenta de Israel ao discurso de Antonio Guterres no dia 24 de outubro no Conselho de Segurança da ONU – quando o secretário-geral das Nações Unidas disse que, embora condenasse nos termos mais veementes o massacre cometido pelo Hamas no dia 7 de outubro, queria lembrar que esse massacre não ocorreu no vácuo -, Illan Pappé alerta:

“Esta reação sugere que um novo tipo de alegação de antissemitismo pode estar agora sobre a mesa. Até 7 de outubro, Israel pressionava para que a definição de antissemitismo fosse alargada para incluir críticas ao Estado israelense e questionamentos à base moral do sionismo. Agora, contextualizar e historicizar o que está acontecendo também poderia desencadear uma acusação de antissemitismo”.

“Assim, o ataque de 7 de outubro é usado por Israel como pretexto para prosseguir com políticas genocidas na Faixa de Gaza. É também um pretexto para os EUA tentarem reafirmar a sua presença no Médio Oriente. E é um pretexto para alguns países europeus violarem e limitarem as liberdades democráticas em nome de uma nova ‘guerra ao terror’”.

No artigo, intitulado “Por que Israel quer apagar o contexto e a história da guerra em Gaza”, Illan Pappé repassa, afinal, o contexto e a historicização do ataque do dia 7 a Israel, não sem repisar o óbvio: “a selvageria do ataque do Hamas não pode de forma alguma ser justificada, mas isso não significa que não possa ser explicada e contextualizada”.

Assim, Pappé lembra que o contexto histórico mais amplo remonta a meados do século XIX, “quando o cristianismo evangélico no Ocidente transformou a ideia do ‘retorno dos judeus’ num imperativo religioso milenar e defendeu o estabelecimento de um Estado judeu na Palestina como parte do processo que levaria à ressurreição dos mortos, ao retorno do Messias e ao fim dos tempos”.

“A teologia – prossegue Illan Pappé – tornou-se política no final do século XIX e nos anos que antecederam a Primeira Guerra Mundial, por duas razões”.

“Primeiro, foi incorporada aos interesses daqueles que desejavam desmantelar o Império Otomano e incorporar partes dele ao Império Britânico. Em segundo lugar, ressoou entre aqueles da aristocracia britânica, tanto judeus quanto cristãos, que ficaram encantados com a ideia do sionismo como uma panaceia para o problema do antissemitismo na Europa Central e Oriental, que produziu uma onda indesejável de migração judaica para a Grã-Bretanha”.

“Quando estes dois interesses se fundiram, levaram o governo britânico a emitir a famosa – ou infame – Declaração de Balfour, em 1917”.

“Os pensadores e ativistas judeus que redefiniram o judaísmo como nacionalismo esperavam que esta definição protegesse as comunidades judaicas do perigo que os judeus enfrentavam na Europa, centrando-se na Palestina como o espaço desejado para o ‘renascimento da nação judaica’”.

Daí para alinhavar um projeto colonial para a Palestina histórica, foi um pulo. Só que na Palestina existiam os palestinos, fator solenemente desconsiderado.

Segue Illan Pappé:

“Outro contexto histórico relevante para a atual crise é a limpeza étnica da Palestina em 1948, com a expulsão forçada de palestinos para a Faixa de Gaza a partir de aldeias sobre cujas ruínas foram construídos alguns dos colonatos israelenses atacados em 7 de Outubro. Estes 750 mil palestinos desenraizados perderam as suas casas e se tornaram refugiados”.

“Esta limpeza étnica foi notada pelo mundo, mas não condenada. Como resultado, Israel continuou a recorrer à limpeza étnica como parte do seu esforço para garantir o controle total sobre a Palestina histórica, restando o mínimo possível de palestinos nativos. Isto incluiu a expulsão de 300 mil palestinos durante e após a guerra de 1967, e a expulsão de mais de 600 mil da Cisjordânia, de Jerusalém e da Faixa de Gaza desde então”.

“Há também o contexto da ocupação israelense da Cisjordânia e de Gaza. Ao longo dos últimos 50 anos, as forças ocupacionais infligiram punições coletivas aos palestinos nestes territórios, expondo-os ao assédio constante por parte dos colonos israelenses e das forças de segurança e aprisionando centenas de milhares deles”.

“Desde a eleição do atual governo messiânico fundamentalista de Israel, em novembro de 2022, todas estas políticas duras atingiram níveis sem precedentes. O número de palestinos mortos, feridos e presos na Cisjordânia ocupada disparou. Além disso, as políticas do governo israelenses em relação aos locais sagrados cristãos e muçulmanos em Jerusalém tornaram-se ainda mais agressivas”.

Quem quer que se atreva, hoje, a pôr na mesa estas considerações, corre o risco, como diz Pappé, de ser imediatamente acusado de “antissemitismo”, mesmo diante de quatro mil crianças assassinadas por Israel na Faixa de Gaza – 10 mil palestinos no total, até agora.

A julgar pela cobertura da mídia internacional do genocídio em curso em Gaza, sem se atrever a chamar a coisa pelo nome, pode-se dizer que o terrorismo ideológico de Israel tem surtido o seu efeito.

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