No fim do ano passado, no terceiro dia da primeira Copa do Mundo com VAR, a Argentina marcou seu primeiro gol no torneio, contra a Arábia Saudita, graças a um pênalti marcado pelo VAR.

Não tinha sido lance duvidoso. A torcida nem tinha pedido pênalti. Nenhum jogador argentino tinha esboçado algum protesto. A TV nem tinha mostrado replay quando, de repente, o juiz começou a correr na direção do monitor. Depois, no mesmo jogo, a Argentina teve dois gols anulados pelo VAR, por causa de impedimentos de unhas por cortar.

Meu filho, como eu, adora a seleção da Argentina, mas não lembro de ele ter ficado confuso, chocado, irritado com aquele confuso, chocante, irritante placar de VAR em Copa do Mundo: Argentina 1, Arábia Saudita 2.

Ele só despertou para a torcida apaixonada de uns poucos meses para cá, tardiamente, aos 9 anos de idade. Não mais que de repente se revelou um vascaíno roxo, como o pai. Alguns poderão dizer que é uma péssima hora para isso, com o Vasco na zona de rebaixamento do Brasileirão, pior ataque do campeonato.

Sim, o pior ataque do campeonato, com apenas 15 gols marcados em 20 jogos. Houve um décimo sexto, marcado na noite deste domingo, 27, em São Paulo, contra o Palmeiras. O gol, porém – golaço! – foi anulado pelo VAR, escandalosamente mal anulado pelo VAR. O VAR anulou um gol de um jogador que veio com a bola dominada da intermediária, se livrou da marcação, ajeitou e chutou de fora da área, no cantinho.

Por que, então, o gol foi anulado? Porque no lance anterior, muitos segundos antes, um jogador do Vasco tinha a ponta da chuteira além daquelas linhas em certa medida arbitrárias de georreferenciamento, traçadas em imagem congelada no momento supostamente exato, apenas supostamente, em que a bola sai do pé do passador.

O ex-árbitro Sálvio Spinola, hoje comentarista, classificou a anulação do gol do Vasco como “o maior erro do VAR brasileiro”. Seria o caso de avaliar se o próprio VAR não seria o maior erro do futebol.

No momento em que o Paulinho acertou a sapatada no canto direito do gol do Palmeiras, meu filho enlouqueceu, deu um salto do sofá, gritou, correu, deu voltas na mesa da sala com os braços erguidos – “Vasco! Vasco! Vasco!” -, deslizou de joelhos no chão, comemorando como se ele próprio tivesse marcado aquele gol. Na TV, os jogadores do Vasco comemoravam efusivamente também, demoradamente. Dei um abração no meu filho. Ele todo feliz. Voltamos para o sofá, para segurar com os olhos o resultado, quem sabe ver o Vasco marcar mais um.

Mas, súbito, o juiz põe o dedo indicador no ponto eletrônico. Morreu ali a alegria instantânea de uma criança que berra, pula e ergue os braços no momento em que vê a bola balançar a rede adversária. Morreu ali o futebol.

É uma péssima hora para uma criança começar a torcer, torcer mesmo, à vera, para o Vasco? Não penso assim. Após a chegada do técnico Ramón Diaz, o time está mais arrumado, mais confiante, mais competitivo, dá sinais de que vai ter luta para tentar escapar de mais um rebaixamento, que era dado como certo até três rodadas atrás. É a hora de vibrar em dobro com cada golzinho suado do nosso piorzinho ataque do campeonato, confiando que vai melhorar.

É uma bela hora para um criança começar a torcer pelo Vasco. Mas aí…

… mas aí veio o VAR, ou melhor, quem o engendrou, quem o opera, e ensinou um menino de 9 anos de idade a não comemorar os gols do seu time do coração.

“Espera aí, rapazinho, senta aí. É como diz aquele general lá: ‘pra que a pressa?’. Alguém pode ter desequilibrado alguém no lance de origem. Vamos ver aqui. Vamos ver também essa questão dos milímetros. Já aprendeu na escola que o milímetro é a milésima parte de um metro? Veja aqui, menino, olha: tá vendo essa pontinha da chuteira aí na frente. Ha! Mesma linha, hein? Eu sabia. É isso que dá contratar atacante que calça 43”.

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