Está marcado para o próximo sábado, 9, em Brasília, o III Encontro Nacional Pela Liberdade Pró-Armas, organizado pelo Movimento Pró-Armas, que é o maior movimento armamentista da América Latina.
Ao passo que se aproxima a marcha de atiradores que muitos veem como um “esquenta” para o próximo 7 de setembro bolsogolpista, o líder do Pró-Armas vem afinando o discurso do povo de Deus escolhido para lidar com o “maligno aliado do PCC que bate às nossas portas”. Uma referência a Luis Inácio Lula da Silva.
Em transmissão ao vivo no YouTube realizada nesta quarta-feira, 6, e intitulada “o momento mais importante das últimas décadas”, o fundador e presidente do Movimento Pró-Armas, Marcos Pollon, que se apresenta com o lema integralista “Deus, pátria e família” – acrescido de “liberdade” – disse que sua organização luta “a favor da própria palavra de Deus”:
“Em tempos difíceis, Deus prepara os melhores homens e melhores mulheres. Eu escutei em muitos lugares do Brasil pessoas lamentando o fato de que esses momentos difíceis vieram a ocorrer na nossa geração. Eu, ao contrário, dou graças a Deus por isso, porque se for na minha vez que houve esses dissabores e destemperanças da nossa época, é porque Deus prepara para mim, para a minha geração, a possibilidade de reunir forças, parceiros e aliados valorosos para lutar contra isso”.
Na mesma transmissão, feita para convocar Colecionadores de armas, Atiradores esportivos e Caçadores de javalis (CACs) para o III Encontro Nacional Pela Liberdade Pró-Armas, Pollon ecoou Jair Bolsonaro, que para 2022 anuncia “luta do bem contra o mal”, contra o “inimigo interno”; jogar “dentro das quatro linha, mas…”.
“Nesse momento de crise e incertezas, Deus nos levantará diante do mal e irá nos preparar para enfrentarmos esses desgraçados, malignos. Não se trata simplesmente de um problema político. O Brasil enfrenta hoje um problema moral onde um aliado do PCC, um favorecedor de sequestradores, um criminoso confesso, um déspota, um tirano, bate às nossas portas. E é presente no 9/7 que nós responderemos. Nós não nos ajoelharemos diante deste déspota. Estaremos juntos no 9/7 para mostrar que nós somos um povo ordeiro, pacífico, mas não somos bobos”, disse Pollon.
Por mais que venha repetindo que o “levante” dos CACs contra o “aliado do PCC que bate às nossas portas” será “pacífico e ordeiro”, a tônica da atuação de Marcos Pollon em prol do armamento civil ao longo dos últimos anos é precisamente a do “direito fundamental” de defender a família e a inviolabilidade do lar contra bandidos comuns.
O líder do Pró-Armas insufla um exército de homens e mulheres com posse e, em muitos estados, já com porte de armas de fogo contra aquele que considera “um déspota” – o favorito para vencer as eleições. Ao mesmo tempo, jura que quer a paz. Quando confrontado com esta capciosa dualidade de seu discurso, o ferrenho bolsonarista Pollon costuma dizer que é vítima de “narrativa”.
E se o caldo entornar?
Em artigo publicado em maio no Valor Econômico, intitulado “O tiro que pode perturbar as eleições”, Maria Cristina Fernandes cita o pesquisador Bruno Langiani, que se debruça sobre clubes de tiro e afirma: 95% dos mais de 700 mil CACs que existem hoje no Brasil são bolsonaristas fervorosos.
Langiani não acredita que o Movimento Pró-Armas, com seu slogan “não é sobre armas, é sobre liberdade”, tenha capacidade para organizar ações contra o TSE, STF, eleições, mas lembra que uma fração de CACs radicalizados, insuflados, seria o suficiente para um tremendo estrago. Se o caldo entornar, certas lideranças não poderão dizer que nada têm a ver com isso, que só queriam incentivar o tiro esportivo e controlar a população de javalis.

Sobre a capacidade de organização e mobilização dos CACs, o volume da marcha do próximo sábado em Brasília poderá dizer algo a respeito.
Uma das presenças certas no III Encontro Nacional Pela Liberdade Pró-Armas é o deputado Coronel Tadeu. Semanas atrás, Tadeu disse o seguinte, a poucos metros de Pollon, a uma platéia de atiradores numa audiência pública sobre a liberação do porte de armas para CACs em São Paulo:
“Eu peço encarecidamente a todos vocês: se nós queremos liberdade, vamos lutar por essa liberdade. Antes que a gente passe para uma luta mais violenta, vamos lutar no campo político, que ainda é o nosso terreno, ainda é o campo mais limpo e mais sagrado para que a gente possa fazer valer a nossa vontade”.
Um pacifista…
Também nesta semana, em outro vídeo, Marcos Pollon aparece dizendo que, para ele, aborto é um “não assunto”; “é aquele negócio que se você quiser debater comigo, ou eu vou te cuspir, ou eu vou te bater”; “se eu pegar um marmanjo defendendo matar um bebê, eu vou meter a mão. É igual pedofilia. Eu vou meter a mão”.
Não é sobre armas, é sobre aborto, agora?
E prosseguiu:
“Se você levantar o número de bebês assassinados nos ventres de suas mães no Brasil, é nojento. Se levantar nos países onde a esquerda governa, é catastrófico. É uma verdadeira ode a Satanás, fazem verdadeiras oferendas ao demônio com isso daí. Se nós não nos levantarmos, se não fizermos a nossa parte, a gente vai ver a nossa liberdade ceifada diante dos nossos narizes, e amanhã não vai adiantar fazer nada. A hora de se levantar é agora. A hora de chamar para a briga é agora”.
Uma briga pacífica, naturalmente, dirá o maior líder armamentista do Brasil…
… e outro pacifista
Marcos Pollon é pré-candidato a deputado federal pelo Mato Grosso do Sul, atendendo a um pedido do seu amigo Eduardo Bolsonaro, que também vem convocando para a marcha de atiradores em Brasília, “para mostrar a nossa força para os nossos congressistas”:
Eduardo Bolsonaro, naturalmente, é um pacifista também:
