Há exatos 20 anos, no dia 21 de agosto de 2003, o Senado da Argentina derrubou as leis que anistiavam os repressores da mais recente ditadura instalada no país, que durou de 1976 a 1983. Naquele dia, o Senado, seguindo decisão da Câmara, anulou as leis da Obediência Devida e do Ponto Final.
A primeira, de 1986, livrava de responsabilização os repressores de baixa patente, porque estariam apenas cumprindo ordens ao sequestrar, torturar e matar. A segunda, de 1987, salvava os cabeças da sanguinária ditadura argentina. As duas leis, junto com os indultos de Carlos Menem, garantiam impunidade a autores de crimes contra a humanidade.
De certa maneira, os indultos e as leis de anistia foram, na Argentina, o outro lado da moeda da conclusão do processo de liberalização da economia do país iniciado na ditadura e que teve seu ápice com o neoliberalismo radical dos anos 1990 – com Menem e seu ministro da Economia, Domingo Cavallo. A Argentina sofre até hoje as consequências desse processo.
Após sua aprovação no Congresso no dia 21 de agosto de 2003, a lei que anulou a Obediência Devida e o Ponto Final foi promulgada por Néstor Kirchner 12 dias depois, em 2 de setembro. Em 2005, a Suprema Corte da Argentina declarou as leis de anistia inconstitucionais e a constitucionalidade da sua revogação. Os processos contra os repressores foram reabertos. Hoje, 20 anos depois, já são mais de 1.100 agentes da ditadura condenados pela justiça da Argentina.
Hoje, 20 anos depois, o favorito para vencer a eleição para a presidência da Argentina, em outubro, é o fascista Javier Milei. Milei já anunciou que, se de fato eleito, criará um “Conselho de Assessores Econômicos da Presidência”, cujo chefe seria Carlos Rodríguez, ex-vice-ministro de Economia no segundo mandato de Carlos Menem.
A vice de Milei, Victoria Villarruel, egressa da “família militar”, é uma conhecida militante negacionista dos crimes da ditadura. Após o fim da ditadura, em meio à agitação na caserna com os processos contra os repressores – agitação que levou à Obediência Devida e ao Ponto Final -, o pai de Victoria, o repressor Eduardo Villarruel, pegou 40 dias de prisão por se recusar a jurar obediência à Constituição do seu país.
Nas Paso, as eleições preliminares da Argentina, realizadas há pouco mais de uma semana, a chapa de Javier Milei e Victoria Villarruel venceu nas urnas colocadas nas bases militares da Antártida argentina. Entre os milicos ali lotados, o fascista e a negacionista amealharam 63% dos votos.