Gaza: quando a morte virou símbolo e cheiro nesta cidade?

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A mais recente atualização da contagem de cadáveres produzidos na Palestina histórica desde o sábado passado dá conta de 2.670 palestinos mortos por Israel em Gaza e 53 na Cisjordânia.

Em Gaza, os necrotérios estão colapsados e mais de mil pessoas estão sob os escombros, sem chance de resgate, e ainda não entraram nos números oficiais de assassinados.

Notícias dão conta de que o ar de Gaza está impregnado pelo “odor de morte”. A mesma coisa aconteceu 41 anos atrás, em 1982, no massacre de Sabra e Chatila, no Líbano, quando cerca de dois mil refugiados palestinos foram mortos por milicianos cristãos aliados de Israel.

Come Ananás reproduz abaixo um poema de Amal Abuqamar, poeta nascida na cidade de Gaza. O poema está no livro “Gaza, terra da poesia”, publicado no Brasil no ano passado pela editora Tabla.

Para a morte.
Quando a morte virou símbolo nesta cidade?

Os cigarros da hora se acabaram
enquanto o homem traga o tempo irritado entre os lábios,
esmaga a cinza do pecado e enterra milhares de mulheres nos dedos.
Deus pendura as plaquinhas desta vida no corpo dos mortos,
e os fios emaranhados choram abraçados pelo sangue
e se estendem entre os túmulos dos vivos para puxar o coração dos coveiros.
Morre a vida da areia,
morrem as trepadeiras em cima dos corpos nos muros destruídos que não conservam as lágrimas dos perdedores.
Tudo aqui morre, tudo menos os mortos.
A morte aqui é eternidade,
a morte aqui é aquele bêbado que escreve um poema numa rocha usando o cinzel de seu eu, sem se dar conta.
Não sabe que há uma fenda na pedra da existência, vazia de sentido.

A morte aqui é luta,
luta entre as coisas esvaziadas de sua realidade
e uma mulher que, como eu, esfrega o corpo com o sal do nada.
Nenhuma morte cola no vestido das noivas quando gritam nas primeiras núpcias.
Nenhuma luz nasce do ventre da estéril que carrega dentro dela um poema.
Não tem sentido o vazio,
não tem outro sentido a realidade
Que este: nascer, sempre, do amanhecer do sétimo céu.

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