Foto: Mídia Ninja.

No dia 30 de dezembro do ano passado, horas antes de Jair Bolsonaro viajar para os EUA ainda no exercício do mandato, um despacho da presidência da República pôs fim à Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP).

No dia seguinte, em pronunciamento em rede nacional, o presidente em exercício, general da reserva Hamilton Mourão, apagou as luzes do governo Bolsonaro prometendo “dura oposição ao projeto progressista” do governo Lula.

Passados seis meses de “projeto progressista”, a CEMDP ainda não foi reativada. Neste meio tempo, até o teto de gastos voltou, sob o rebranding de “arcabouço fiscal”.

No dia 28 de março, familiares das vítimas da ditadura reuniram-se com o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio de Almeida, para cobrar a volta da CEMDP. No mesmo dia, o Brasil de Fato trouxe a informação, dada ao jornal pela ex-presidente da comissão Eugênia Gonzaga, de que um decreto neste sentido já estava na mesa de Lula e que seria publicado nos dias subsequentes.

Nos dias subsequentes, porém, o presidente Lula disse em conversa com jornalistas que esperava chegar à sua mesa “um decreto consistente” para a reinstalação da CEMDP. Isso foi no dia 6 de abril. Até agora, nada de progresso em matéria de memória, verdade, justiça e reparação.

Nesta quarta-feira, 28, o repórter Rubens Valente informou que a Agência Pública tenta há três meses agendar uma entrevista sobre o assunto com Silvio de Almeida. Em vão. Rubens Valente classificou a falta de resposta do Ministério dos Direitos Humanos como “um silêncio retumbante”.

“Vergonha”, seria um termo melhor.

De certa forma, porém, compreende-se. O que Silvio de Almeida poderia dizer, alegar, pedir a quem há décadas tenta arrancar dos quartéis informações sobre o paradeiro dos seus entes queridos assassinados pelos entes idolatrados, festejados, protegidos por militares bem vivos da ativa e da reserva – eles próprios metidos em conspiratas golpistas, décadas após o fim da ditadura.

O que Silvio de Almeida poderia dizer? Que não se pode melindrar os militares com oitivas e diligências para busca e identificação dos cadáveres que produziram no passado? O que poderia alegar? Algum acordo inimaginável com a caserna, para “apaziguar” a caserna? O que poderia pedir aos familiares das vítimas da ditadura? Um pouco mais de paciência?

Na última segunda-feira, 26, Dia Internacional de Combate à Tortura, familiares de mortos e desaparecidos nas mãos da ditadura publicaram um manifesto por meio do qual vêm “rogar” – é esta a palavra usada – a reativação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.

Eles lembram:

“Acreditamos que tentativas de destruir a democracia seguem acontecendo quando NÃO se cumprem os deveres de um estado democrático de sustentar ações para garantir o esclarecimento da Verdade, o resgate e a construção da Memória, e a aplicação da Justiça contra a impunidade dos crimes cometidos”.

Come Ananás reproduz abaixo a íntegra do manifesto, com o link para assinatura de apoio.

MANIFESTO de familiares de mortos e desaparecidos

DIA INTERNACIONAL DE COMBATE À TORTURA

A democracia brasileira tem sido alvo de graves e permanentes ataques ao seu amadurecimento e estabilidade, fato que preocupa todas as pessoas que defendem o Estado Democrático de Direito, sobretudo nós que assinamos este manifesto: familiares de mortos e desaparecidos políticos que perderam suas vidas porque resistiram à ditadura civil-militar imposta. Por ser esta a política implementada, a de extermínio de seus opositores.

Acreditamos que tentativas de destruir a democracia seguem acontecendo quando NÃO se cumprem os deveres de um estado democrático de sustentar ações para garantir o esclarecimento da Verdade, o resgate e a construção da Memória, e a aplicação da Justiça contra a impunidade dos crimes cometidos.

Neste Dia Internacional de Combate à Tortura, nós que sofremos as agruras herdadas da vida marcada por perseguições, tortura, e assassinatos de nossos familiares, há várias gerações acompanhamos diferentes governos sem que tenhamos tido acesso às circunstâncias verdadeiras da morte nem aos corpos de nossos entes queridos. Carregamos o sofrimento dos cruéis e bárbaros assassinatos e o desaparecimento pela ocultação de cadáveres. 

Sendo assim, e entendendo que é preciso também retomar todos os trabalhos e empreender todos os esforços necessários para a construção de uma sociedade onde a tortura e o extermínio não sejam naturalizados, não passem impunemente, nós: ex-cônjuges, irmãos, irmãs, filhos, filhas, netos, netas, sobrinhos e sobrinhas de mortos e desaparecidos políticos, viemos rogar que seja imediatamente reativada a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, criada pela Lei nº 9.140/1995, e suas ações com a finalidade de que:

a) Sejam retomadas as políticas de expedição de atestados para fins de retificação de assentos de óbito;

b) Sejam garantidas as condições necessárias, financeiras e de pessoal, para que se prossiga com as medidas de buscas e identificação de corpos de nossos entes queridos; realização de oitivas testemunhais, audiências públicas, entre outras diligências e atividades a que está orientada essa comissão; 

c) Sejam observadas a evolução da legislação nacional e internacional na interpretação da aplicação de prazos prescricionais, ou decadenciais, para os pleitos de reconhecimentos e de reparações a familiares de mortos e desaparecidos políticos; 

d) Sejam solicitadas audiências e outras medidas que considerar pertinentes para que o Supremo Tribunal Federal (STF) seja instado a reinterpretar a Lei de Anistia que até os dias de hoje garante a impunidade de centenas de torturadores e assassinos.

A partir desta data, 26 de Junho de 2023, Dia Internacional de Combate à Tortura, familiares de mortos e desaparecidos assinam, e convidam a toda sociedade civil a também assinar este manifesto, através do formulário abaixo:

confira a lista de assinaturas neste link: CLIQUE AQUI 

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