O diretor teatral e dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, 86, foi internado no Hospital das Clínicas, em São Paulo, nesta terça-feira (4), após um incêndio atingir o apartamento no bairro Paraíso, na zona sul da capital paulista. Foto: José Celso Martinez/Instagram

Morreu nesta quinta-feira, 6, o dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, aos 86 anos de idade. Em outubro de 2017, quando Zé Celso tinha 80, aconteceu a famosa reunião entre ele e o magnata da mídia Senor Abravanel, vulgo Silvio Santos.

A reunião, arranjada por João Dória, então prefeito de São Paulo, foi sobre o terreno que circunda o Teatro Oficina, na região central São Paulo.

O terreno é do magnata, que queria construir ali três torres com mil apartamentos. O dramaturgo, por seu turno, queria que o terreno, em vez de ser usado para sufocar o Oficina, fosse transformado em um centro cultural, com área verde e tendas para shows, teatro e circo.

“Vai começar o espetáculo” disse Silvio Santos quando Zé Celso chegou ao seu escritório. A reunião, porém, foi um espetáculo não de Zé Celso, mas de Silvio Santos: um típico espetáculo de cinismo, desprezo e chacota de um bufão opulento diante de um artista de verdade.

Eis algumas das falas do bufão dirigidas a Zé Celso naquele dia, sempre aos risos e arrancando gargalhadas dos seus assessores:

“Aquele terreno não foi de graça pra mim. Eu tive que pagar cada um deles que saiu de lá. Não é um dinheiro para eu jogar fora nem pra dar de auxílio a quem quer que seja”.

“O meu secretário deu uma boa ideia: a gente bota lá a cracolândia e o drogado que mais se destacar no dia ganha um prêmio”.

“Eu tenho culpa de ser rico? Eu dei sorte. Você não deu, problema seu”.

“Não é possível a gente pagar por um terreno e não ficar com ele, nem que seja para não fazer nada. Isso aqui é uma democracia ou é um regime totalitário?”.

Foi quando entrou em campo o “mediador”, com João Dória sugerindo que, em vez de torres ou de tendas, o terreno em volta do Teatro Oficina abrigasse uma área de “retail”, porque com um “mall” você cria um “asset”.

“Como na América. Como o teatro Bradesco”.

Zé Celso: “O Teatro Bradesco é horroroso. Uma coisa muito colonizada, muito enlatada”.

‘Eu tiro de letra’

Na reunião, Zé Celso insistiu: “A gente tem que pensar na cidade. Eu tenho 80 anos. Ele [Abravanel] tem mais do que eu. Daqui a pouco a gente some do mapa. A cidade fica”.

Silvio Santos respondeu assim: “Eu não quero morrer. Eu não vou morrer. Se você quer morrer, pode ir”. E riu-se novamente, e seus assessores gargalharam outra vez.

Na ocasião, o bufão tinha 86 anos, idade com a qual o dramaturgo agora se vai. Na ocasião, terminada a reunião, Silvio Santos disse assim a Zé Celso:

“Você vai ver. Você vai se ferrar. Vou transferir a cracolândia pra lá e vou dar prêmio. O maior droguista todo dia ganha um prêmio”.

“Pode ser. Não tem problema. Isso aí eu tiro de letra. Eu sei lidar com a coisa”, respondeu Zé Celso, dando as costas ao bufão. E saiu de cena.

Graças a Zé Celso, à sua resistência, até hoje não há torres oprimindo o Oficina, nem o teatro foi incorporado a algum mall, “como na América”.

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