Neste domingo, 8, o embaixador de Israel na ONU, Gilad Erdan, discursou em Nova Iorque dizendo que o ataque sofrido pelo seu país no dia anterior tinha sido “o nosso 11 de setembro”. Quase ao mesmo tempo, corriam o mundo imagens de um grande prédio vindo abaixo não em Tel-Aviv, mas em Gaza, e cenas familiares de pessoas fugindo da nuvem de poeira causada pelo enorme desabamento.
A contradição entre o que se ouve e o que se vê é apenas aparente: quando classifica como “o nosso 11 de setembro” o cruento ataque do Hamas a Israel no último sábado, 7, Gilad Erdan comunica rigorosamente o mesmo que quer dizer o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, quando anuncia, na manhã desta segunda-feira, 9, que o Exército de Israel vai invadir a Faixa de Gaza em um “assédio total” para caçar “animais humanos”.
Israel tem agora uma “Guerra ao Terror” para chamar de sua, com tudo o que isto significa e as autorizações prévias que isto carrega.
Ou, como disse candidamente um jornalista da TV brasileira na manhã desta segunda, “os israelenses acabam se sentindo obrigados a retaliar de maneira muito violenta”. O mesmo sobre como se sentem e o que se veem obrigados a fazer diante de ataques e humilhações, isto você raramente já viu ou verá na TV a respeito dos palestinos.
A diferença da Guerra ao Terror do facínora Netanyahu é que o que está por vir em Gaza pode fazer com que waterboarding, prisões secretas e ataques com drones pareçam maravilhas da Convenção de Genebra.
Israel teve seu 11 de setembro num 7 de outubro, 22 anos após o ataque às torres gêmeas, em Nova Iorque. O povo palestino teve seu 11 de setembro mais de meio século antes do 11 de setembro, em 1948, quando centenas de milhares de famílias palestinas foram expulsas das suas terras para a efetivação, com as bênçãos da “comunidade internacional”, da forma jurídica do sionismo invasor, o Estado de Israel. Os palestinos chamam aquele êxodo em massa de Nakba, a catástrofe.
Come Ananás reproduz abaixo a íntegra do capítulo 23 do livro “A desordem mundial”, do cientista político e historiador Moniz Bandeira (1935-2017). Trata-se de uma espécie de “resumão” da Questão Palestina, do terror na Palestina invadida e da inversão dos termos desta equação.
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O presidente George W. Bush, ao receber na Casa Branca Maḥmūd ʿAbbās (também conhecido como ‘Abū Māzin), eleito presidente da OLP e da Autoridade Palestina, após a eliminação de Yassir Arafat, saudou-o, em discurso no Rose Garden, como o líder capaz de criar um Estado palestino “peaceful, democratic” e rejeitar a violência. Declarou que Israel “must remove unauthorized outposts and stop settlement expansion”, e que a solução viável de dois Estados “must ensure contiguity of the West Bank, and a state of scattered territories will not work”. Pouco depois, em 24 de junho de 2002, no Rose Garden, declarou que “it is untenable for Israeli citizens to live in terror”, mas, também, “it is untenable for Palestinians to live in squalor and occupation”. E, a dizer que aquela situação não apresentava perspectiva de melhoria de vida, pois os israelenses continuariam “to be victimized by terrorists”, e Israel tinha que defender-se, reconheceu que “in the situation the Palestinian people will grow more and more miserable” e que a única solução estava na criação de “two states, living side by side in peace and security”.
O presidente George W. Bush invertia, porém, os termos da equação. Decerto, não se podia justificar os atentados de terror cometidos pelo Ḥamās e pelo Jihad Islâmica, com bombas e foguetes contra a população civil israelense; mas não era a violência do Ḥamās que estava a gerar a ocupação do território da Palestina pelo Estado de Israel. Era exatamente a contínua ocupação do seu território, e a consequente situação “more and more miserable” do povo palestino, que gerava a violência e alimentava o terror do Ḥamās e do Jihad Islâmica. O Road Map apresentado pelo denominado Quarteto do Oriente Médio, que representantes da ONU, União Europeia, Estados Unidos e Rússia formaram para salvar o processo de paz, foi inicialmente aceito pelo então primeiro-ministro da Autoridade Palestina, Maḥmūd ʿAbbās, em 2003, e pelo primeiro-ministro Ariel Sharon, cujo gabinete o aprovou, mas o inviabilizou com inúmeras ressalvas. A retirada de 21 assentamentos da Faixa de Gaza foi iniciada pelo governo de Israel, em 2005, em meio a vasta resistência de milhares de colonos israelenses, muitos dos quais tiveram de ser retirados, pelos soldados da IDF, de caves e sinagogas, onde se refugiaram. Quatro assentamentos foram igualmente desmontados.
Ariel Sharon, entretanto, sofreu, em 4 de janeiro de 2006, mais um derrame, hemorragia cerebral maciça, que o deixou em estado de coma, a viver em estado vegetativo, no Sheba Medical Centre, onde faleceu oito anos depois, em 11 de janeiro de 2014, com a idade de 85 anos. E o Estado de Israel não cumpriu nenhum acordo. Por outro lado, Maḥmūd ʿAbbās, embora um dos fundadores da PLO (al-Fatah), eleito presidente da Autoridade Palestina, não tinha o mesmo carisma histórico, liderança e força que Arafat para conter as tendências radicais, representadas, sobretudo pelo Ḥamās, e Jihad Islâmica, organizações sustentadas pela Irmandade Muçulmana. Daí que a OLP (Fatah) perdeu as eleições de 2006. A vitória do Ḥamās aguçou as tensões e conflitos armados irromperam entre as duas facções, em junho de 2007. A Autoridade Nacional Palestina, cuja jurisdição abrangia os Territórios Ocupados por Israel (Gaza, Jerusalém Oriental e West Bank/Cisjordânia), sob a presidência de Maḥmūd ʿAbbās, ficou restrita, destarte, à Cisjordânia.
Com a enfermidade de Ariel Sharon, Ehud Olmert, do Kadima, assumiu a função de primeiro-ministro (2006 a 2009). E, não obstante o presidente George W. Bush haver defendido a criação de dois Estados, na Palestina, o fato foi que os Estados Unidos não quiseram ou não puderam impedir que Israel prosseguisse com o alargamento de suas fronteiras. Tampouco a condenação internacional, as resoluções da Assembleia Geral da ONU e decisões da Corte Internacional de Justiça sustaram a incoercível expansão dos assentamentos judaicos, cuja população crescia em média 5% ao ano. O Quarteto do Oriente Médio não conseguiu retomar o processo de paz.
Desde 1996, quando Binyamin Netanyahu, pela primeira vez, assumiu o poder, amplamente apoiado pelos ultraortodoxos e judeus russos imigrantes, os assentamentos ilegais de colonos recresceram, rapidamente, tanto na Cisjordânia quanto em Jerusalém Oriental, não obstante haver ele assinado, nos Estados Unidos, com Yassir Arafat, o Protocolo de Hebron (1997), e o Wye River Memorandum (1998), ambos sob o patrocínio do presidente Bill Clinton. Toda a sua política visou inviabilizar a criação de um Estado palestino soberano e contíguo, vizinho do Estado de Israel.
O primeiro-ministro Binyamin Netanyahu jamais escondera ser contrário à criação de um Estado palestino. Nutria um trauma e, decerto, um ressentimento pessoal contra os palestinos. Seu irmão mais velho, o tenente-coronel Yonatan (Yon) Netanyahu, comandante de um destacamento das IDF, morreu em 4 de julho de 1976, aos 30 anos, durante a Operation Thunderbolt, a fim de resgatar 105 judeus capturados por terroristas da Frente Popular de Libertação da Palestina e da organização alemã Baader-Meinhof, no Airbus da Air France, sequestrado e levado para o aeroporto de Entebbe, Uganda, quando voava entre Tel Aviv e Paris. Um ano depois, aos 28 anos, em Boston, Binyamin Netanyahu manifestou abertamente rejeição à ideia de um Estado palestino, junto com o Estado de Israel, ao dizer que tal Estado já existia e era a Jordânia. E acrescentou que “there is no right to establish a second one on my doorstep, which will threaten my existence, there is no right whatsoever”.
Em 1996, logo após tornar-se primeiro-ministro, quando visitou Ariel, um grande assentamento na Cisjordânia (West Bank), declarou: “Nós estamos aqui, permanentemente, para sempre.” E prometeu a implantação de novas comunidades judaicas, ali, nas terras que pertenciam a um futuro Estado palestino. Entretanto, durante a campanha eleitoral de 2009, declarou que, se tivesse garantia de desmilitarização, e se os palestinos reconhecessem Israel como Estado judaico, ele estaria disposto a concordar com um real tratado de paz, “um Estado palestino desmilitarizado lado a lado com o Estado judaico”. As palavras de Netanyahu não passavam de fumus vendere e significavam que ele, na realidade, não aceitava qualquer Estado palestino. A desmilitarização implicava a carência de soberania e possibilitava que o Estado de Israel continuasse a adentrar e ocupar toda a Cisjordânia, a reduzir, gradativamente, uma área de 5.640 km², o espaço que restava para a população árabe, cerca de 4,6 milhões, já dispersa em bolsões isolados e sem sequer o direito de votar.
Antes de ser eleito, em 2009, Binyamin Netanyahu, na condição de ministro para Assuntos Estrangeiros, proclamara que a questão da imigração (aliyah) e a absorção dos imigrantes estava na lista de prioridades do governo, que trabalharia vigorosamente para que judeus de todos os países do mundo fossem habitar Israel. A pressão demográfica tornou, portanto, incoercível o alargamento das fronteiras do Estado, que ele promoveu, como primeiro-ministro, a uma velocidade sem precedentes, mediante a autorização ilegal de novos assentamentos na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental. De 1948 até o ano de 2014, cerca de ou mais de 3.152.14611 de judeus, dos quais 1.223.723 procedentes da antiga União Soviética, migraram para Israel, ademais de muitos outros, originários da Etiópia e França. E o fato foi que, desde quando voltara ao poder, em 2009, até o início de 2014, o número de judeus assentados na Cisjordânia cresceu 23%, saltando para 355.993, enquanto o total da população de Israel, calculada em 8 milhões, aumentou somente 9%. Como primeiro-ministro, em 2010, afirmou, em uma cerimônia de plantação de árvores na Cisjordânia, que “we are planting here, we will stay here, we will build here. This place will be an inseparable part of the State of Israel for eternity”.
E a aliyah continuou. Mais e mais judeus chegaram, a fim de assentar colônias nos territórios ocupados por Israel, especialmente a Cisjordânia e Jerusalém Oriental. Em apenas três meses de 2015, de janeiro a março, chegaram a Israel cerca de 6.499 judeus, a vasta maioria da Europa, dos quais 1.971 da Ucrânia, um incremento de 215% sobre os 625 que migraram no mesmo período de 2014, enquanto o número de russos alçou para 1.515, um aumento equivalente a 50%. Ao mesmo tempo, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu conclamou os judeus a imigrarem em massa para Israel, dizendo que os receberia “com os braços abertos”. Em torno de 310.000 a 500.000 judeus ainda viviam na França, um terço ou metade do 1 milhão dos que moravam na Europa, em 2010, embora nos países do Leste, do extinto bloco soviético, o número houvesse desde então dramaticamente decaído.
A crescente pressão demográfica, decorrente da aliyah, forçou, diretamente, a expansão das colônias na Cisjordânia, e na área de Jerusalém Oriental, inviabilizando de fato a criação de outro Estado na Palestina. E era essa a estratégia de Netanyahu. Aumentar mais e mais a população judaica de Israel, que crescera de 806.000, em 1949, para 6,3 milhões (74,9%), em 2015, quando os árabes representavam 20,7% da população (1,7 milhão) e 4,4% (366.000 pessoas) eram identificados como pertencentes a outras etnias e nacionalidades. Entretanto, segundo o Palestinian Central Bureau of Statistics, a estimativa era de que, em 1915, 2,9 milhões de palestinos vivessem na Cisjordânia, 1,85 milhão na Faixa de Gaza, 1,47 milhão no Estado de Israel, em uma população de 12,1 milhões, da qual havia 5,49 milhões refugiados em países árabes e 675.000 em outras partes do mundo. A previsão era de que o número de palestinos na Cisjordânia e em Gaza equivalesse ao total de judeus, aproximadamente, da ordem de 6,4 milhões, em 2016, chegando a 7,14 milhões em 2020, enquanto o número de judeus aumentaria apenas para 6,87 milhões se a taxa de crescimento corrente se mantiver. O cerne da questão para Israel consistia em preservar indisputável e clara maioria judaica no total da população, segundo o professor Sergio Della Pergola da Universidade de Jerusalém. Esse — na sua opinião — era o pré-requisito para sua “future existence as a Jewish and democratic state”. Sim, democracia exclusiva para judeus. E aí a razão pela qual Netanyahu não anexava os territórios ocupados por Israel, para não dar aos palestinos os mesmos direitos que os judeus, nem admitia a criação de um Estado palestino. Tendência democrática ele nunca tivera nem manifestara. E jamais dera valor à vida dos palestinos.
Em março de 2009, quando Joe Biden, então vice-presidente dos Estados Unidos, visitou Israel, Netanyahu, como um desafio à política do presidente Barack Obama, anunciou o plano de construir 1.600 novas residências na parte oriental de Jerusalém, prevista para ser capital de um futuro Estado palestino, violando a lei humanitária (especialmente a Quarta Convenção de Genebra), conforme as resoluções aprovadas pelo Conselho de Segurança e a Assembleia Geral da ONU. “This is starting to get dangerous for us”, disse-lhe Biden, acrescentando que “what you’re doing here undermines the security of our troops who are fighting in Iraq, Afghanistan and Pakistan. That endangers us, and it endangers regional peace”. Netanyahu não cedeu. E Joe Biden nada pôde fazer em face do respaldo a Israel do multimilionário lobby judaico, o American-Israeli Public Affairs Committee (AIPAC), um dos fatores reais de poder nos Estados Unidos, sem o qual nenhum congressista se elegia.
Em fevereiro de 2011, o Conselho de Segurança aprovou por 14 votos e os Estados Unidos, como sempre, vetaram a resolução, apresentada por dois terços das Nações Unidas, condenando como ilegais e um obstáculo à paz os assentamentos de Israel na Cisjordânia. Porém a embaixadora do Brasil na ONU, Maria Luiza Viotti, então na presidência rotativa do Conselho de Segurança, reafirmou, inclusive para a imprensa, que “Israel’s ongoing settlement activity had become the most important obstacle to a comprehensive solution” e, a acentuar que o texto da resolução declarava todos os assentamentos “illegal and an obstacle to Peace”, acrescentou que ambas as partes deviam buscar uma resolução “in support of a two-State Solution”.
Contudo, nada deteve a ocupação da Cisjordânia por Israel. Lá, Ehud Olmert, como primeiro-ministro (2006–2009), promovera, em dois anos, a construção de 5.120 residências. De acordo com o Israel’s Central Bureau of Statistics (CBS), havia, em fins de 2013, 350.010 habitantes nos assentamentos da Cisjordânia, excluindo Jerusalém Oriental. Àquele tempo, 2013, o Conselho de Direitos Humanos da ONU, com base no relatório da Fact-Finding Mission enviada à Palestina, considerou que os crescentes assentamentos, promovidos por Israel, configuravam “creeping form of annexation which compromised the right to self-determination of the people of the Occupied Palestinian Territories;” e exortou a comunidade internacional no sentido de pressionar Israel para que fossem desmantelados “all settlements which were in flagrant violation of international law”. Em janeiro de 2014, Netanyahu anunciou, no entanto, a construção de 1.400 novas casas e apartamentos nas áreas que pertenceriam a um futuro Estado palestino, a Cisjordânia e Jerusalém Oriental, onde já viviam 500.000 israelenses. E, na primeira metade de 2015, o número de colonos lá estabelecidos saltou para 547.000, entre 2,8 milhões de palestinos. A continuidade de tais assentamentos ilegais, conformando vilas e cidades, cada vez mais difíceis ou mesmo impossíveis de desmontar, constituía de fato o maior obstáculo à paz e à criação de um Estado palestino soberano, em um território contíguo.
Outrossim, a despeito de que a Resolução 181 da ONU (1947) houvesse concebido Jerusalém como corpus separatum, Israel, que ficara com a parte ocidental sob seu controle, anexou a parte oriental, deixada com a Jordânia, durante a Guerra dos Seis Dias (1967), e a intenção era de que toda a cidade permaneceria como eterna e indivisível capital do povo judeu. Essa pretensão o Knesset legalizou, em 1980, ao proclamar Jerusalém “eterna e indivisível capital” do Estado de Israel. E, de fato, ela foi efetivada, ao longo dos anos, espoliando os palestinos de suas residências e direitos. De 1967 a 2006, um total de 8.269 palestinos, residentes em Jerusalém Oriental, perderam suas residências; somente em 2006, 1.363 palestinos foram privados de seus direitos de viver na cidade; e, entre 2007 e 2009, 5.585, em Jerusalém Oriental, foram despojados de tudo pelo governo de Israel.
Desde que Ariel Sharon, em 2005, desmantelou 21 assentamentos em Gaza, retirou as tropas das IDF e entregou a área à Autoridade Palestina, esse pequeno enclave de 225.000 milhas quadradas (582.747 km²), entre Israel, Egito e o Mar Mediterrâneo, continuou sob estrito bloqueio naval e terrestre, coadjuvado pelo Egito, que fechou as passagens pela sua fronteira, a impedir a entrada e saída de pessoas e bens (exceto os que considerava “humanitários”), o que levou à virtual paralisação da indústria lá existente, privada de matérias-primas e mercados de exportação. O pretexto era evitar o contrabando de armamentos para o Ḥamās, Netanyahu, porém, justificou constantemente a erradicação dos palestinos da Cisjordânia, com o argumento de que a retirada de Gaza das forças das IDF, em 2005, possibilitara que o Ḥamās vencesse as eleições parlamentares lá realizadas.
Era uma falsa percepção. O candidato Ismaʻīl Haniyya venceu, em 2006, as eleições na Faixa de Gaza, em virtude, certamente, da eliminação de Yassir Arafat, cuja liderança era muito superior à de Maḥmūd ʿAbbās. Yassir Arafat, mais objetivo e pragmático, entendera que a coexistência com o Estado de Israel era inevitável; Israel constituía uma realidade econômica, social, política e militar, reconhecido como personalidade jurídica do Direito Internacional; uma realidade irreversível. E com seu carisma, construído ao longo das lutas, induziu a OLP (al-Fatah) a aceitar as Resoluções 242 (novembro de 1967) e 338 (outubro de 1973) do Conselho de Segurança da ONU, o que implicava o reconhecimento do Estado de Israel, bem como a renunciar ao terrorismo, cujas operações não haviam produzido qualquer resultado. E seu objetivo foi facilitar o fim dos conflitos e avançar as negociações a fim de viabilizar, dentro da moldura dos acordos de Oslo, a criação de um Estado palestino independente, em 22% da Palestina histórica, paralelo ao Estado de Israel, já a ocupar 78%. Porém era mais duro nas negociações com Sharon, recusou-se a conceder a Israel o controle sobre o Nobre Santuário, i.e., a mesquita al-Aqsa/Domo da Rocha, e, uma vez eliminado, o Ḥamās adquiriu mais força e não só venceu as eleições como derrotou a OLP e consolidou o poder em Gaza, em choques armados com Fatah, travados em 2007. Maḥmūd ʿAbbās contou com o respaldo do MI6 para robustecer a Autoridade Palestina, sob a presidência, cujo espaço se restringiu à Cisjordânia, com a implantação de mais e mais assentamentos judaicos.
O Ḥamās, ao conciliar-se com a OLP, em 2014, para formar um governo de coalizão, os termos do entendimento entre as duas organizações, implicitamente, deviam levar ao reconhecimento do Estado de Israel dentro das fronteiras de 1967. Mas Netanyahu suspendeu as negociações com a Autoridade Palestina e afastou-se do processo de paz, que nunca passou, efetivamente, de falácia. As tensões recrudesceram. O Ḥamās perseverou então em não admitir a existência de Israel como Estado judaico e continuou a disparar foguetes Qassam contra suas cidades. De qualquer modo, o fato foi que, a pretexto de retaliar o disparo desses foguetes desde Gaza, como atos de terrorismo, o primeiro-ministro Netanyahu armou a Operation Protective Edge, após o acordo de reconciliação entre Fatah e o Ḥamās.
As dificuldades nas negociações com Israel induziram Maḥmūd ʿAbbās a reaproximar-se do Ḥamās, com o propósito de acumular força, ao conjugar politicamente a Cisjordânia, sob a jurisdição formal da Autoridade Palestina, com a Faixa de Gaza. Daí que as duas facções palestinas haviam formado um governo de unidade, provisoriamente reconhecido pelo Departamento de Estado, conquanto classificasse o Ḥamās como organização terrorista. Porém Netanyahu advertiu Maḥmūd ʿAbbās de que ele devia escolher entre a paz com Israel ou o Ḥamās. A conciliação dos governos de Gaza e Ramallah constituiu significativo e histórico acontecimento. Mas não condizia com os interesses de Netanyahu. Não lhe convinha. Era inevitável, portanto, que as hostilidades, mais cedo ou mais tarde, eclodissem. E em 10 de junho de 2014, três jovens israelenses, entre 16 anos e 19 anos de idade — Naftali Frankel, Gilad Shaar e Eyal Yifrach —, foram raptados, na estrada, enquanto pediam transporte para retornar do assentamento Alon Shvut, em Gush Etzion, na Cisjordânia, ocupada por Israel, às suas residências.
O primeiro-ministro Netanyahu, sem qualquer evidência, logo acusou o Ḥamās pelo sequestro. Khālid Mashʿal, seu principal dirigente, e o governo da Autoridade Palestina negaram responsabilidade pelo acontecimento, conquanto, sem o seu conhecimento, membros isolados das brigadas Izz ad-Din al-Qassam pudessem haver raptado e assassinado os três jovens. O Ḥamās não estava interessado em escalar o conflito, mas o propósito de Israel consistia não só em vingar o assassinato dos jovens colonos, como também demolir tudo o que restara do seu aparato, após as sangrentas operações de guerra — Operation Cast Lead —, em 2008, Operation Pillar of Cloud/Defence, 2012 — que já haviam assolado Gaza. E Netanyahu reagiu como se realmente o Ḥamās fosse culpado pelo acontecimento. As IDF, a título de buscar os três jovens, iniciaram então a Operation Brother’s Keeper, que durou 11 dias e prendeu, na Cisjordânia, 419 palestinos, inclusive todos os líderes do Ḥamās. Durante algumas escaramuças, tombaram três soldados das IDF, enquanto dezenas de palestinos pereceram. As buscas duraram três semanas e os cadáveres dos três jovens foram descobertos, semienterrados, embaixo de rochas, próximo à cidade de Hebron. No mesmo dia, 1º de julho, a Força Aérea de Israel executou três ataques de precisão contra as estruturas do Ḥamās e do jihad islâmica, em resposta a 18 foguetes disparados de suas bases na Faixa de Gaza. Após os funerais, em Halhul, fundamentalistas israelenses realizaram manifestações, gritando “morte aos árabes”, e, como retaliação, alguns sequestraram e, após espancar, queimaram vivo o adolescente palestino de 16 anos, Mohammed Abu Khdeir. Houve, em seguida, uma sequência de ataques a crianças árabes.
Ainda que Salah al-Arouriri, organizador, em 1991, das brigadas Izz ad-Din al-Qassam, dissesse (talvez a título de propaganda) para clérigos, na Turquia, onde estava exilado, que seus militantes raptaram e mataram os três jovens israelenses, Khālid Mashʿal continuou a negar que o Ḥamās, do qual era o dirigente, houvesse cometido a atrocidade contra os jovens israelenses. E com forte razão. Nem o governo de Israel nem a mídia internacional deram maior importância ao fato de que, mediante um panfleto, que logo circulou em Hebron, a primeira organização a reivindicar a responsabilidade pelo bárbaro martírio dos jovens foi o Da’ish, alegando que se tratava de represália pela morte de três de seus militantes na Cisjordânia.42 Com efeito, é possível que militantes das brigadas al-Qassam, empenhados em criar raízes na Cisjordânia, tenham aderido ao Da’ish. E o Ḥamās certamente não tinha interesse em desafiar Israel com tão hediondo crime, mero ato de terror, sem qualquer finalidade política, a poucos meses de formar um governo de coalizão com a OLP. Tratou-se evidentemente de banditismo e cruel provocação.
O Ḥamās estava consciente de que não podia acabar com o Estado de Israel. Não tinha condições militares de derrotá-lo. A assimetria era imensa. Era um non-State actor, com limitado armamento. O sistema antimísseis Iron Dome, de Israel, interceptava cerca de 90% dos foguetes Qassam, cujo alcance era de apenas 3 km a 4,5 km, sem adequação para alvos militares, foguetes primitivos, autopropulsados e sem guia, de fabricação local. O terror era mais psicológico, do que realmente físico, ainda que os foguetes Qassam algumas vezes atingissem áreas densamente povoadas e vitimassem civis israelenses. De qualquer modo, se bem que o Ḥamās não configurasse qualquer ameaça real, Netanyahu, a odiar obsessivamente os palestinos, não podia suportar um foco de resistência à dilatação do Estado de Israel por ele almejada como objetivo estratégico do seu governo. O assalto a Gaza, portanto, era uma questão de timing, clima e esfera da operação militar.
O governo de Netanyahu estava à espera de uma evasiva de selfdefence, o motivo para escalar o conflito. E os radicais das Brigadas Qassam e/ou o Jihad Islâmico, no curso de uma semana, dispararam cerca de 29 foguetes e morteiros que atingiram Hayfa, Jerusalém e Asdod, em Israel. A pedido de Khālid Mashʿal, dirigente do Ḥamās, o ministro para Assuntos Exteriores do Egito, Sameh Shoukry esforçouse para acalmar a situação junto a Netanyahu. Não conseguiu. E, de 7 para 8 de julho de 2014, tropas de infantaria, artilharia, tanques e engenheiros militares das IDF invadiram a Faixa de Gaza, deflagrando a Operation Protective Edge, com a participação da Força Aérea e de navios de guerra, bem como o suporte de Shin Bet, conhecida em hebraico pelo acrônimo de Shabak (Sherut ha’Bitachon ha’Klali), um dos três serviços de inteligência de Israel e cujo lema era “Magen Velo Yera’e” (Defender sem ser visto).
A campanha durou 50 dias, de 8 de julho a 26 de agosto de 2014, e matou 2.251 palestinos, a maioria civis, entre os quais 539 crianças. Ademais de tantas letalidades, 11.23144 foram mutilados, feridos ou permanentemente desfigurados. Por outro lado, as IDF tiveram 66 baixas e sete civis israelenses morreram, em consequência dos foguetes do Ḥamās. A ofensiva terrestre, com artilharia e outros explosivos, e os ataques aéreos, o lançamento indiscriminado de mísseis e bombas, em áreas densamente povoadas, devastaram milhares de residências, cerca de 20.000 habitantes perderam seus lares, mais de 100.000 edifícios foram total ou parcialmente arruinados, em uma área de 360 km², assim como arrasados 148 escolas, 15 hospitais, 45 centros médicos, 247 fábricas e 300 centros comerciais, inclusive um moderno, em Rafah, depósitos de combustíveis e as plantas de geração de energia e de suprimentos de água. As IDF derrocaram toda a infraestrutura civil de Gaza e danificaram a agricultura. Em fins de julho de 2014, a ONU estimava que quase um quarto dos 1.700 residentes em Gaza haviam sido deslocados pelos ataques e todos estavam a enfrentar a falta de suprimentos básicos. O fato foi que, realmente, cerca de 300.000 palestinos foram desabrigados e muitos buscaram refúgio nas unidades da UNRWA (United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees in the Near East).
A Amnesty International acusou as IDF de haver cometido “war crimes” durante os 50 dias de campanha, com desproporcional e indiscriminada acometida contra áreas densamente povoadas, destruindo escolas e outros edifícios, onde civis se abrigavam, sob a alegação de que eram usados para esconder foguetes. E o United Nations Human Rights Council (UNHRC), posteriormente, aprovou resolução, na qual não somente manifestou grave preocupação com “possible war crimes”, cometidos por Israel, como condenou todas as violações dos direitos humanos, rompendo as leis internacionais, e o “appalled at the widespread and unprecedented levels of destruction, death and human suffering caused” em Gaza.
De fato, durante a Operation Protective Edge, centenas de pessoas foram detidas nos territórios palestinos ocupados por Israel, sem acusação ou julgamento, com base apenas em informações secretas. Não lhes foi permitido ter acesso a advogados e, incomunicáveis, continuaram a ser torturadas e maltratadas pelos agentes de Shin Bet/Shabak, o serviço de segurança interna de Israel, durante vários dias, às vezes, semanas. Os métodos eram similares aos usados pela CIA, em Guantánamo e Abu Ghraib (Iraque), e incluíam várias agressões físicas, sovas e estrangulamento, agrilhoamento e situações de estresse prolongadas, bem como ameaças contra suas famílias.
Conforme o Banco Mundial, o bloqueio, as guerras e a pobre governança estrangularam a economia de Gaza e a taxa de desemprego tornara-se a mais alta do mundo, a atingir 43% da população e, entre os jovens, mais de 60%, ao fim de 2014. A população sofria com os serviços públicos muito precários, deficientes, escassez de eletricidade e água, e cerca de 80% dos habitantes dependiam da assistência da United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees para sua sobrevivência, enquanto mais de 40% caíram abaixo da linha de pobreza. E a cidade de Gaza não havia sido reconstruída depois das guerras de 2008 e 2012 porque Israel não autorizava. Conforme o Banco Mundial, “while shocking, these numbers fail to fully convey the difficult living conditions that nearly all Gaza’s residents have been experiencing”.
Mesmo more shocking — acentuou o informe do Banco Mundial —, era a realidade que mais de 1,8 milhão de residentes estavam confinados a uma área de 160 km², uma das mais densamente povoadas do mundo, e não podiam ir além desses limites sem permissão. Desde que estabelecera o bloqueio de Gaza, em 2007, o objetivo de Israel foi manter a população na penúria e a economia à beira do colapso. O ministro da Defesa de Israel, Tzipi Livni, manteve o mais estrito e severo controle sobre os produtos que entravam em Gaza e baniu os mais diversos alimentos, entre os quais spagetti e outras massas, coentro, ervas para temperos e até ketchup, por considerá-los desnecessários. E as crianças sofreram ainda mais as consequências. De acordo com o Center for Mind-Body-Medicine, baseado em Washington, mais de um terço das crianças de Gaza apresentava sinais de “post traumatic stress disorder”, mesmo antes do conflito armado de 2014, e depois muito mais. “The statu quo in Gaza is unsustainable.” E esse status quo foi exacerbado pelo bloqueio e três brutais operações militares de Israel, em 2008, 2012 e 2014. Gaza delenda est. Estava em escombros. Em novembro de 2015, o número de refugiados atingia no mínimo 7,1 milhões de pessoas, em diversos países do mundo, e cerca de 427.000 internamente deslocados, com a destruição de seus lares, conforme a United Nations Refugees Agency (UNHCR).
O ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter, ao visitar a Cisjordânia, em maio de 2015, declarou em entrevista à imprensa que a situação de Gaza era “intolerable”, e esteve com Maḥmūd ʿAbbās, em Ramallah, mas não se encontrou com o primeiro-ministro Netanyahu, por considerar “waste of time”. Na ocasião, embora condenasse os atos criminosos do Ḥamās, disse que seu dirigente Khālid Mashʿal não era terrorista, e defendeu a conciliação com Fatah, a fim de que houvesse novas eleições para a Autoridade Nacional Palestina. O ex-presidente Jimmy Carter tinha razão. O Ḥamās, na realidade, é uma facção política nacionalista e militante, empenhada em estabelecer um Estado palestino, e, embora não reconhecesse a legitimidade do Estado de Israel e efetuasse ações de terror, que atingiam civis, Khālid Mashʿal, seu líder, rejeitou publicamente qualquer comparação com o ISIS, feita por Netanyahu, de modo a justificar a guerra contra Gaza. “At the moment, there is zero chance of the two-state solution”, disse o ex-presidente Jimmy Carter, em agosto de 2015. E, a ressaltar que as perspectivas de paz eram as piores possíveis, acentuou que o primeiro-ministro Netanyahu “has any intention” de fazer qualquer progresso nesse sentido, i.e., alcançar a paz, de nunca haver querido sinceramente a solução de dois Estados e haver desde cedo decidido adotar “a one-state solution”, mas sem dar aos palestinos iguais direitos.
Essa era realmente a decisão de Netanyahu, conquanto Israel pudesse ganhar em uma década cerca de US$ 120 bilhões, com a solução de dois Estados, segundo as estimativas da Rand Corporation, ao passo que os palestinos apenas ganhariam US$ 50 bilhões. Em outubro de 2015, em reunião do Comitê de Defesa e Assuntos Exteriores do Knesset, Netanyahu revelou aos demais membros que não tinha plano de entregar o controle da Cisjordânia aos palestinos como parte do processo de paz. E afirmou: “A esse tempo, necessitamos controlar todo o território por um futuro previsível.” Ele cria que “metade dos palestinos era governada pelo Islã extremista, que nos quer destruir: se houvesse eleições amanhã, o Ḥamās venceria”. A perspectiva, naquelas circunstâncias, era de que o Ḥamās realmente triunfasse; não estava envolvido em inócuas negociações com Israel e, ademais, dispunha de um serviço de assistência à população árabe, que a Autoridade Palestina não dava. Porém, não apenas a situação de Gaza era funesta, insustentável. Também em Jerusalém Oriental e na Cisjordânia a convulsão latejava. E os conflitos eclodiram entre 13 e 15 de setembro, véspera do Rosh Hashana, o Ano-Novo judaico, no Templo do Monte, onde também estava edificada a Mesquita de al-Aqsa, junto ao Domo da Rocha, o Nobre Santuário (Haram al-Sharif), reverenciado como o lugar de onde o Profeta Muhammad teria ascendido ao céu e para receber al-Qurʾān diretamente de Allah.
As tensões latentes entre israelenses e palestinos fermentavam em todos os territórios ocupados por Israel. Entretanto, escalaram cada vez mais após a polícia de Israel haver invadido a mesquita de al-Aqsa, para derrubar as barricadas que dentro os palestinos haviam erguido, usando granadas de gases lacrimogêneos e granadas estonteantes.73 E desde então os choques não cessaram. Os palestinos recorreram aos mesmos métodos usados pelos judeus zelotes, nacionalistas,74 que efetuaram uma campanha de terror, desde o ano 48 a.C., durante o reinado de Idumean Herodes, até a queda de Jerusalém e de Massada, em 70 d.C. e 73 d.C., com o propósito de encorajar a insurreição contra o domínio de Roma. Os sicarii, infiltrados nas cidades, apunhalavam legionários romanos e judeus colaboradores, com a sica (adaga curva), escondida debaixo da manta. E assim fizeram os palestinos, desde a invasão da Mesquita de al-Aqsa, cerca de 2.000 anos depois. Diversos israelenses foram assim assassinados, em Jerusalém, e o levante escalou, com os palestinos a enfrentarem os soldados de Israel, lançando pedras, muitas com fundas (slingshot), como David abatera Goliath, no vale de Elah (Emek HaElah).
Os apunhalamentos, tiros, pedradas e incêndios tornaram-se acontecimentos cotidianos e as IDF responderam com agressiva e letal repressão contra os suspeitos de terrorismo. Só em outubro, centenas de palestinos, inclusive 150 crianças, foram presos. Dezenas de palestinos, sobretudo jovens, foram mortos pelas IDF, cujas tropas, ademais de bloquearem o acesso dos palestinos às plantações de oliveiras, perto da vila de Nablus, impedindo a colheita, demoliram ali residências e confiscaram terras. E a estação de rádio palestina Al Hurria, em Hebron (Cisjordânia), foi invadida durante a noite, no início de novembro, por soldados das IDF, que destroçaram os equipamentos e se apossaram dos transmissores, sob a alegação de que eram usados para incitar ataques aos israelenses.
O primeiro-ministro Netanyahu acusou Maḥmūd ʿAbbās de incitar a onda de violência dos palestinos e advertiu que os israelenses tinham de aceitar que não havia probabilidade de paz e que eles iriam continuar “a viver pela espada”. Mas o próprio comandante do Diretório Militar de Inteligência (Agaf HaModi’in — Aman) de Israel, o major-general Herzl Halevi, judeu ortodoxo, declarou em reunião do gabinete, em 1º de novembro de 2015, que os sentimentos de fúria e frustração, especialmente entre os jovens, eram “parte da razão da onda de ataques de terror em Jerusalém e na Cisjordânia”. Esclareceu que os jovens se lançavam aos ataques terroristas porque estavam em desespero com o estado de coisas “e sentiam que nada tinham a perder”. O major-general Herzl Halevi, contrariando o que dissera o primeiro-ministro Netanyahu, informou que Maḥmūd ʿAbbās tentava manter a calma na Cisjordânia e instruíra suas forças no sentido de frustrar os atentados contra Israel, mas parecia que parte da juventude escapava do controle da Autoridade Palestina.
A intifada, iniciada em setembro e que ainda em novembro não cessara, refletia o sentimento de revolta que germinou ao longo de meio século de ocupação do território palestino por Israel, opressão e discriminação. E, da mesma forma que o ex-presidente Jimmy Carter, o ex-primeiro-ministro de Israel, Shimon Peres, do Partido Trabalhista, arguiu, em entrevista à Associated Press, que Netanyahu nunca foi sincero a respeito de paz, que nunca “escapou do domínio da conversa”, nem com a criação de outro Estado, ao lado de Israel, porém a alternativa para a existência de dois Estados na Palestina era “a guerra contínua e ninguém podia manter a guerra para sempre”. “Netanyahu é contra o Estado binacional, mas admite que devemos viver para sempre pela espada; isto é um pesadelo”, comentou o cientista político Menachem Klein, cuja promoção a Universidade Bar-Ilan negou por considerá-lo de esquerda. A estratégia de Netanyahu era efetivamente manter os israelenses em medo e ansiedade.
A intolerância do governo de Netanyahu era tal que seu assessor de imprensa, Ran Baratz, zombou, desrespeitosamente, do secretário de Estado, John Kerry, ao dizer que sua idade mental “não excedia a de um menino de 12 anos”, assim como acusou o presidente Obama de antissemitismo por defender a solução de dois Estados. Netanyahu não o demitiu. As desculpas oficiais não cicatrizaram as feridas. O presidente Obama apenas fez um “realistic assessment” de que não seria possível alcançar a paz na Palestina antes do término do seu mandato e, segundo seu assessor de Segurança Nacional, Benjamin Rhodes, ele gostaria de ouvir como Netanyahu pretendia, sem conversações de paz, evitar a solução de um Estado, estabilizar a situação e assinalar que estava comprometido com a solução de dois Estados. E o fato era que nunca esteve comprometido com tal solução. A aceitação de criar mais um Estado, na Palestina, por parte de Netanyahu, significou apenas verba et praeterea nihil.
Entretanto, não obstante as desavenças e dificuldades no relacionamento com Netanyahu, sobretudo por causa do Acordo Nuclear com o Irã, Obama destinou, no orçamento de 2016, US$ 3,1 bilhões, a título de assistência militar, considerado pela AIPAC a “most tangible manifestation of American support” a Israel, o que lhe permitirá a compra de esquadrões de F-35, totalizando 33 jatos, além de vários outros petrechos bélicos, dando assim lucros à indústria de armamentos. E Israel continuou o maior recipiente cumulativo da assistência militar dos Estados Unidos, desde a Segunda Guerra Mundial, havendo recebido dos contribuintes americanos um montante de US$ 124,3 bilhões (em dólares correntes não inflacionados), como assistência bilateral, i.e., assistência militar, o que tornou as IDF em uma das mais sofisticadas forças armadas do mundo, superior às de todos os Estados vizinhos.
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